sábado, 26 de maio de 2012

Solidariedade com "O Banqueiro dos Pobres"

Fonte: Jornal Expresso
Em: 12 de Março de 2011
Por: Alexandre Coutinho

No passado dia 2 de Março o Banco Central do Bangladesh demitiu Muhammad Yunus do seu lugar de director-geral do Grameen Bank, o banco de microcrédito que fundou há 18 anos, alegando o facto de ele ter ultrapassado o limite de idade da reforma em vigor, que é de 60 anos. A notícia levantou uma onda de protesto, sobretudo no estrangeiro, onde Muhammad YunusPrémio Nobel da Paz 2006, e a sua obra são por todos sobejamente conhecidos e reconhecidos.

No seu próprio país, Muhammad Yunus passou a ser visto como inimigo por grande parte da classe política (em particular os dois maiores partidos que se têm sucedido no poder) depois de denunciar publicamente a ganância desta pelo poder do dinheiro e a corrupção generalizada.
Alguns factos permitem enquadrar a escalada da primeira-ministra do Bangladesh, Sheikh Hasina, e do seu Governo contra o fundador do microcrédito, sobretudo, depois de ele ter anunciado a intenção de criar um partido político (ideia a que viria a desistir).
Primeiro, o Governo do Bangladesh veio acusar o Prof. Yunus de fraude fiscal e nomeou uma comissão para investigar "práticas menos legais" do Grameen Bank. Não houve provas destas práticas nem condenações até à data. A actual primeira-ministra chegou a catalogá-lo de "sanguessuga dos pobres" e a sua ministra dos Negócios Estrangeiros de "corrupto".
Em Dezembro último, uma reportagem de um canal de televisão norueguês acusou Yunus de ter "desviado" dinheiro da cooperação norueguesa (Norad) para fins que não o microcrédito, nomeadamente, uma joint-venture com a multinacional Danone, para a produção de produtos lácteos para os pobres. Os equívocos foram então esclarecidos e o governo da Noruega veio desmentir ter havido desvios desta natureza.
Finalmente e para além das razões (ou falta delas) burocráticas, o Banco Central do Bangladesh "despediu", com efeitos imediatos, Muhammad Yunus do seu cargo de director-geral do Banco que fundou em 1983. Curiosamente, o Prof. Yunus já completou 70 anos, mas só agora, o Banco Central do Bangladesh se apercebeu que ele tinha ultrapassado o limite de idade da reforma de 60 anos.
Tornou-se claro que se trata de uma campanha contra o bom nome do Prof. Muhammad Yunus e a instituição que criou em benefício dos mais pobres do seu país e cujo modelo foi replicado em todos os continentes com resultados nunca vistos na luta contra a pobreza e a marginalização económica dos mais frágeis da sociedade. O GrameenBank (banco da aldeia, em língua bangla) não é um banco comercial típico, já que é propriedade dos seus mais de 8 milhões de clientes pobres.
A situação criada pode ter consequências graves directas (e ainda imprevisíveis) sobre a vida e o futuro de 8.5 milhões de famílias pobres no Bangladesh e, indirectamente, sobre este largo movimento da sociedade civil mundial do microcrédito que Yunus inspirou e no qual se revê como símbolo da coragem, de lucidez, de determinação e carisma.
A notícia da exoneração de Muhammad Yunus correu mundo e depressa originou um amplo movimento de indignação contra o Governo do Bangladesh e de apoio ao Prof. Yunus, por parte de governos, personalidades de todos os quadrantes e latitudes, ONG e demais organizações da sociedade civil, entre as quais, a Associação Nacional de Direito ao Crédito (ANDC) que, na sua génese, se inspirou no trabalho e na personalidade do Prof. Muhammad Yunus, e que com ele "privou" antes e depois da sua constituição.
"A ANDC não pode deixar de manifestar a sua indignação pela forma como o Governo da Senhora Sheikh Hasina está a tratar uma das pessoas mais inventivas na luta contra a pobreza e pela dignificação dos mais fracos, não apenas no seu país mas no mundo inteiro. Convenhamos que há formas menos deselegantes e menos expeditas para tratar um Prémio Nobel da Paz e conhecido "Banqueiro dos Pobres", escreveu Mohamed Lemine Ould Ahmed, presidente da direcção da ANDC.

1 comentário:

  1. O Filantropo Indiano Muhammad Yunus, economista de formação, foi quem deu origem ao microcrédito. Numa fase inicial no seu país na cidade de Bangladesh e posteriormente expandindo-o aos Estados Unidos da América com a ajuda do Presidente Bill Clinton.
    A génese do microcrédito não é de todo a de um crédito convencional para consumo, mas sim um crédito dirigido a indivíduos "excluídos" ou sem acesso ao crédito convencional que tenham um projecto de negócio válido e que apenas careçam de capital para o iniciar. Inicialmente dirigido apenas a mulheres, dada a sua primordial influência na vida familiar e o facto de ajudar de certa forma na sua emancipação livrando-as da opressão a que estão sujeitas em países de terceiro mundo, o microcrédito foi implementado através de um estudo inaugural levado a cabo pelos alunos do Professor Yunus, que formavam os indivíduos ensinando-os a gerir os seus negócios.
    Este projecto pioneiro do GrameenBank, tinha objectivos claros de facilitar o crédito a indivíduos pobres dando preferência às mulheres (promovendo desta forma a igualdade de direitos e entre géneros), eliminar a exploração dos pobres (alvos de elevados juros aplicados no seguimento de créditos) por agiotas, e por fim criar oportunidades de emprego.
    Quanto mais desenvolvido é um país, menor será tendencialmente a taxa de implementação do microcrédito. No exemplo do mercado português o caso é outro, justificando-se a fraca concretização deste tipo especifico de crédito com entraves como a exigência de dois fiadores, o que convenhamos não ser viável para os que se movimentam no sector pobre da sociedade civil.
    A partir deste artigo é possível retirar algumas reflexões que lamentavelmente marcam ainda nos dias de hoje as sociedades do mundo. Apesar de toda a sua dedicação, empenho e investimento na luta contra as desigualdades sociais, Muhammad Yunus foi alvo de injustiças e atentados contra o seu bom nome e reputação. O apelidado "Banqueiro dos Pobres", acreditou no seu projecto e melhorou a vida e o desenvolvimento de toda uma sociedade pobre até então marginalizada. Os seus actos filantrópicos depressa incomodaram "O Poder" sedento de ganancia e ambição pelo poder do dinheiro. "Poder" este que sentiu ameaçada a sua posição e levou a cabo inúmeras investidas caluniosas contra Yunus, conseguindo por ultimo demiti-lo de funções do banco que fundou, alegando a superação da idade de reforma da personalidade que criou o microcrédito e inspirou a sua propagação por todo o mundo.
    Como reflexão final, é possível depreender que o "Poder é inimigo da igualdade", consagrada nos direitos do homem, a qual define que todos devem ser iguais em direitos e deveres.

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